Tem lei, tem conselho, tem fundo. Mas na prática, o que temos mesmo é um rascunho — um esboço de política pública que ainda não se firmou como sistema.
O que se viu no debate do dia 13 de maio foi o retrato de uma cidade onde a cultura é feita por quem resiste.
A mesa foi composta por figuras centrais da cena cultural prudentina: a produtora cultural, Adriana Scannavez; o atual secretário municipal de Cultura, Paulo Sanches; Iara Oly, presidente do Comuc/PP (Conselho Municipal de Políticas Culturais de Presidente Prudente); a articuladora cultural, Mariane Palhares, representando os Pontos de Cultura da cidade. A conversa não ficou no lugar comum. Pelo contrário, tocou em nervos expostos: como tornar a cultura política de Estado, e não de governo? Como garantir continuidade num país em que a memória institucional é frequentemente atropelada por interesses pontuais?
O SMC (Sistema Municipal de Cultura) é o esqueleto dessa construção. Ele articula conselhos, fundos, planos e espaços para garantir que a cultura deixe de ser privilégio de poucos e e a ser direito de todos. Funciona como uma rede que conecta agentes culturais, territórios e mecanismos de gestão — e depende, essencialmente, de uma gestão compartilhada, transparente e participativa, e temos isso?
Em Presidente Prudente, essa rede vem sendo tecida há décadas, com avanços e tropeços. Da criação do Comuc em 1997 ao tombamento da Escola Jupyra Cunha Marcondes em 2023, ando pela I da Cultura e pelas disputas em torno do Fundo Municipal de Cultura, temos um histórico vivo e tensionado de mobilização social. Ainda em 2024, dois importantes marcos legais foram aprovados: as Leis 14.835 e 14.903, que fortalecem o Sistema Nacional de Cultura e o modelo de fomento cultural no país — e que ecoam no nível municipal.
O desafio, no entanto, segue imenso. Como disse uma das falas da noite, "o sistema funciona?" A pergunta não é retórica — ela nos obriga a encarar o abismo entre o que está no papel e o que acontece no território. Construir um sistema vivo exige mais do que organogramas e editais: requer escuta ativa, envolvimento das comunidades, descentralização real dos recursos e reconhecimento da diversidade cultural que habita cada canto da cidade.
Os Planos Municipais de Cultura são instrumentos estratégicos para garantir políticas de Estado no campo cultural, pois são fruto de “amplo e perene diálogo com atores políticos dos diversos matizes”, e devem ser estruturados com visão sistêmica e territorial, sem abrir mão da transparência e da legitimidade social (COSTA, 2013). Para ela, a diversidade cultural deve ser vista não apenas como algo a se proteger, mas “algo a se desenvolver a partir do entendimento amplo do seu conceito”, colocando o território como espaço central dessa construção.
Em tempos de crise climática — onde os impactos sociais e ambientais se misturam com desigualdades históricas —, pensar o Sistema Municipal de Cultura é também pensar respostas locais para problemas globais. A cultura tem esse poder de articular saberes, práticas, afetos e pertencimentos. Ela é ferramenta de resiliência, mas também de transformação.
Mais do que responder se o sistema funciona, talvez o mais urgente seja perguntar: como fazemos ele funcionar? E, principalmente: com quem?
Referência sugerida
COSTA, Kátia Maria de Souza. Planos municipais de cultura e sua importância para a diversidade cultural. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS CULTURAIS, 4., 2013, Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2013.